Perfil: Zumb.Boys

O Zumb.boys marca a cena por um entendimento único do fazer dança, convidativo e ampliado, que reverbera em seus trabalhos e ações 

Origem e formação

O Grupo Zumb.boys surge em 2003 na Vila Santa Inês, Zona Leste de São Paulo. Dentro de uma oficina de Break do B-Boy Breno na ONG Bom Samaritano, formam uma equipe que foi batizada pelo próprio instrutor, e o grupo de uns 16 b-boys começa a participar de pequenas apresentações e competições.

No mesmo ano, 5 bailarinos do grupo integram o projeto Dança Comunidade, de Ivaldo Bertazzo, causando uma nova articulação da crew, que tem um momento de pausa, e retoma as atividades logo mais, em apenas 3 integrantes, Márcio Greyk, Del Lima e Vinicios Silva.

Os artistas se envolvem em diversos aspectos da cena independente da dança, e passam por programas como o Vocacional e o VAI. É em um encontro com Frank Ejara, durante a organização de um evento, que aparece um questionamento sobre a pequena quantidade de grupos ligados à cultura hip hop que então faziam um movimento para a cena, para a apresentação. Dispostos ao novo, os Zumb.boys respondem que tem esse interesse. Ainda não tinham esse trabalho, mas ali passam a criar.

Em 2007 surgem os primeiros exercícios cênicos do que seria, em 2008, B.E.C.O. (B.boys em Construção Original), a obra de estreia cênica do grupo. A continuidade das atividades em outros núcleos — depois de alguns anos com Bertazzo, Greyk também dança no OMSTRAB — traz uma formação prática única: com esses outros grupos, circulam pela cena independente, em circuito pelos CEUs de São Paulo, enquanto também dançavam em grandes espaços como o Teatro Castro Alves.

Essa multiplicidade de referências é o que forma o Zumb.boys. Ligados com o território de origem, tanto o bairro como a cidade, forma-se um grupo que entende de onde vem, e que se articula em constante reflexão sobre onde mais cabe estar.

Característica e dança

O trabalho a partir de técnicas e expressividades que vêm do break é articulado pelo grupo em propostas de construção cênica, que têm misturado a elaboração para palco com a elaboração para espaços alternativos. A segunda obra do grupo, Dança Por Correio (2012), já propõe a resolução cênica prática da estrutura mínima de produção, porém acompanhada de um planejamento máximo de aproveitamento.

O cuidado na construção de suas propostas, e a dedicação em aprofundar suas reflexões, fazem parte da sinceridade que recobre o trabalho do Zumb.boys. Mesmo que divertidas, suas propostas são desenvolvidas em profundidade, e intensamente elaboradas em jogos e soluções cênicas, que se preenchem com essa transformação de um estilo de dança que se vê mais habitualmente em uma situação específica de batalha e festa. 

O jeito de criar do Zumb.boys, elaborado desde o início dos trabalhos, começou a ser mais formalizado em 2010, quando gravaram um video registrando suas formas de pensar o corpo e a dança. A lógica do trabalho de seu método propõe a importância da preparação e da consciência do corpo, num nível separado da criação estética. Uma lógica que tem a ver com a origem das danças e movimentações que interessam ao grupo, mas que é também uma noção de base da formação: identificar o que é técnica, o que é treinamento, e então colocar essa técnica a serviço de propostas artísticas. 

Durante a pandemia, nos projetos mais recentes do grupo, passaram a compartilhar um tanto dos elementos dessa técnica, em videos que discutem seus processos, e em video-aulas mais completas. Extremamente abertos à partilha, o Zumb.boys trabalha pra fazer a coisa girar, compartilhando suas historias, seus processos, mas também seus projetos e seus orçamentos, tentando levar cada vez mais gente junto pra um plano mais amplo. 

Passos futuros

O que vem pela frente pro Zumb.boys tem a ver com formação, com ampliar acesso a técnica, formas de pensar, informações, e contatos, que frequentemente são mantidos como informação privilegiada e acesso restrito. Eles têm iniciado compartilhamentos com B-Boys e B-Girls externos ao grupo, a partir dos próprios espetáculos, mas trabalham por uma lógica de ampliação: muito do que entendem veio de experiências e oportunidades que conseguiram, estudos e formações de espaços e mestres aos quais nem sempre se tem acesso. Compartilhar é uma forma de aumentar acesso. Uma forma de apresentar pra quem dança um tanto do que existe pra antes da dança, e que determina suas possibilidades.

Focados em fazer acontecer, o Zumb.boys trabalha a dança como presente e entrega. De si, sincera e honesta, e para o outro, com cuidado, interesse, e como partilha. Eles chamam para estar perto, reverberam e ampliam. E por isso respondemos à essa dança: um movimento lindo, em corpos e na sociedade. 

Repertório

2020 – Solos de Laje

2016 – Mané Boneco 

2015 – O que se Rouba

2014 – Ladrão

2012 – Dança por Correio

2008 – B.E.C.O. (B.boys em Construção Original)

Elenco 

Intérpretes Criadores: David Xavinho, Eddie Guedes, Eriki Hideki, Igor Souza, Márcio Greyk

Fundadores: Márcio Greyk e Del Lima

Colaboradores que passaram pelo grupo: Vinicios Silva, Danilo Nonato, Guilherme Nobre


“A primeira vez que eu vi os Zumb.boys dançando Dança por Correio, no meio da intervenção eles chegaram ao meu maior medo: me chamar pra participar de qualquer coisa. Eu notoriamente fujo da interação, e normalmente não vejo dificuldade em dizer um não categórico pra quem me chama pra participar de qualquer coisa. Mas o trabalho deles é construído com tanto cuidado e com tanto carinho que eu não pude dizer não, e recebi uma das entregas de dança que vêm com as cartas coreográficas desse trabalho. Dali pra frente, tive com eles uma relação de encanto e admiração. Assisti a quase tudo que fizeram, escrevi sobre vários dos trabalhos, e não me canso de falar sobre a qualidade encantadora daquilo que eles dançam.”

* Henrique Rochelle é crítico de dança, membro da APCA, doutor em Artes da Cena, Professor Colaborador da ECA/USP, e editor do site Outra Dança

*Este texto é de responsabilidade do autor e não reflete necessariamente a opinião do Portal MUD.

Henrique Rochelle

Henrique Rochelle

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Crítico de dança, Doutor em Artes da Cena (Unicamp), Especialista em Mídia, Informação e Cultura (USP), fez pós-doutoramento na Escola de Comunicações e Artes (USP), onde foi Professor Colaborador do Departamento de Artes Cênicas. Editor do site Outra Dança, é parecerista do PRONAC, redator da Enciclopédia Itaú Cultural, Coordenador do método upgrade.BR de formação em dança, e faz parte da Comissão de Dança da APCA desde 2016.