Crédito das Fotos: Espetáculo
No Brasil do início do século passado, as produções de balé se concentravam no Rio de Janeiro, que era a capital geográfica e cultural do país. Já em São Paulo, as produções de dança se detinham ao Theatro Municipal, Escola Municipal de Bailado e algumas outras escolas, como a da Marina Olenewa – bailarina russa que desembarcou no Brasil com o grupo de Anna Pavlova em 1927 e que exerceu grande influência na formação de gerações de bailarinas. São Paulo também sofreu a influência de grandes balés internacionais, todos seguidores da “moderna” linha russa, que visitavam a cidade em temporadas de apresentações.
Em princípios da década de 1950, o espírito da renovação do ballet, que já comandava as produções artísticas no exterior, nas quais o espetáculo de dança passou a ser um esforço integrado de todos os elementos que o compunham – música, cenografia, indumentária, cenografia e dança – o que elevou a dança ao mesmo patamar das artes plásticas, música, literatura e teatro, motivou a fundação de uma grande companhia de dança da cidade de São Paulo por ocasião das comemorações do quarto centenário da cidade, juntamente com outros grandes feitos, como a construção do Parque do Ibirapuera.
Dirigidos pelo diretor artístico, coreógrafo e professor Aurélio Milloss – húngaro naturalizado italiano – os bailarinos, notadamente brasileiros, estrearam em 1954 como bailarinos profissionais do Ballet IV Centenário, com destaque para a bailarina paulista Edith Pudelko (1927-1984), primeira bailarina da companhia, e Márika Gidali, fundadora e diretora do famoso e renomado Ballet Stagium.
Esses jovens brasileiros receberam treinamento profissional e foram cercados de uma invejável infraestrutura, cujo escopo era denotar o espírito progressista paulista. Para a confecção da cenografia e figurinos foram contratados os artistas plásticos de maior destaque à época – Cândido Portinari, Lasar Segall, Di Cavalcanti e Oswald de Andrade Filho – e importantes compositores ficaram encarregados das trilhas – Heitor Villa-Lobos, Camargo Guarnieri e Francisco Mignone. Interessante observar que, nos idos da década de 1950, São Paulo estava imbuído do mesmo espírito “modernista” russo de alguns anos antes, no qual o conjunto da obra era considerado para a consecução de uma obra de ballet.
As orientações passadas a Milloss pela Comissão dos Festejos do IV Centenário para a criação dos 16 espetáculos que produziu, era que os balés tratassem de temas genuinamente brasileiros, numa nítida tendência vanguardista, já que, até então, os balés produzidos apenas tratavam de temáticas européias e renascentistas. Obras como “Fantasia Brasileira”, “Uirapuru”, “Lenda do Amor Impossível” e “A Cangaceira” imergiram na temática da cultura nacional com o apoio dos grandes artistas plásticos, figurinistas e compositores já mencionados.
A duração do Ballet IV Centenário como companhia paulista oficial e estável foi breve – o encerramento se deu em dezembro de 1955 – porém o legado deixado foi de extrema importância para a dança paulista e brasileira.
O Ballet do IV Centenário formou uma geração de jovens bailarinos profissionais que deram continuidade à herança herdada por meio de outras tantas companhias que sucederam – Ballet do Teatro Cultura Artística (1957), Ballet Amigos da Dança (1958), Ballet Experimental de São Paulo (1962) do qual participou como primeira bailarina Márika Gidali (fundadora do Ballet Stagium), Sociedade do Ballet de São Paulo (1969) da qual participou a grande dama da dança Marilena Ansaldi.
O Ballet do IV Centenário foi um importante marco para a tão jovem história da dança brasileira e inaugurou o espírito vanguardista na dança. É gratificante constatar que profissionais que escreveram essa história, como as mestras Neide Rossi, Márika Gidali e Ruth Rachou, ainda compartilham seus ensinamentos em salas de aula pelo Brasil afora…
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
NAVES, Cássia – DANÇA MODERNA, Cassia Navas, Linneu Dias – São Paulo: Secretaria Municipal de Cultura, 1992.