Eu falo com ele. Apesar de perceber que ele não me responde, acredito que ele pode me escutar. Não é fácil ser paciente. Intuir por alguém que está incapaz de escolher ou fazer por si só.
Percebo que ele deseja café, quando observo a saliva que se forma em sua boca após eu sussurrar a palavra c-a-f-é. Posso perceber o desejo, mas não sou preciso. Ofereço um café arábica, mas talvez o desejo dele seja por “Café Müller”.
Eu falo com ele. Mesmo que ainda nesse estado, sem consciência, sem resposta. Tenho plena certeza dos “Sonhos em Movimento” embora todo o resto seja apático. Apático, simpático e realmente paciente.
Muito mais paciente do que “Orfeu” e eu; que ansiosos, ao toque de cada nota não resistimos em querer observar se nossa “Euridice” está enfim respondendo.
Eu falo com ele. Passarmos tanto tempo juntos, cuidador e paciente, mas eu não o conheço. E em cada ausência de resposta eu me apresso em exercitar, estimular, mexer, mesmo que sem consciência. E talvez ele só deseje silencio e “Água”
Ele não me responde, simplesmente porque nesse momento ainda não pode me responder. Eu não me conformo, mas preciso aceitar. Aceitar carinhosamente meu corpo adormecido e todos os seus esforços para despertar.
Eu falo com ele. Ele não me responde. Mas talvez são essas tantas palavras que não estão deixando ele falar. Ele acreditar, que entre o inconformismo e a aceitação deve haver algum lugar confortável onde se possa dançar.
*Este texto é de responsabilidade do autor e não reflete necessariamente a opinião do Portal MUD.
Assistente de desenvolvimento de produto e aprendiz de ballet
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