Com quem a gente quer falar? Como a informação chega no público? 10 olhares para a pergunta da vez: como divulgar a dança em São Paulo hoje?
Na semana passada, discuti na coluna alguns dos muitos problemas que temos com a comunicação dos espetáculos de dança. Mas como reclamar não basta, na coluna de hoje eu falo de alguns pontos práticos da comunicação da dança, do ponto de vista de quem tá nesse meu lugar: não produzindo, não trabalhando pra grupos, mas querendo saber onde tem dança, e querendo aglutinar essas informações. Arrisco algumas respostas, pras perguntas que mais me aparecem, e mais me parecem necessárias:
– O que já existe?
Faça a sua parte, se divulgue, se comunique, mas vá atrás do que mais existe. A divulgação individual dos espetáculos e dos grupos é muito importante. É por ela que quem já te conhece vai chegar na sua próxima apresentação. Mas pra quem ainda não te conhece, essa é uma comunicação mais difícil. Especialmente pra grupos mais novos, eu insisto na resposta: você quer se inserir no meio da dança? Conheça o meio da dança. Assista seus pares, entenda o que existe nessa cena. Do lado da comunicação, entenda que iniciativas já existem. O Outra Dança completa 10 anos em 2023. O Portal MUD, 9. O Agenda de Dança, 11. E o Conectedance, 14! Tem gente trabalhando nesse segmento há muito tempo. Tem outras iniciativas mais novas e muito interessantes, sobretudo em redes sociais. Descobrir o que já existe é sempre um bom primeiro caminho.
– Como eu entro em contato com os sites?
Essa pergunta aparece com frequência, sobretudo pra quem ainda não tem proximidade com os editores. Pra facilitar o processo, criamos um formulário, que qualquer um pode preencher, pra enviar pra todos esses sites os seus materiais de divulgação. É importante entender que cada site tem um perfil, tem seu recorte, sua proposta, e não é tudo que é divulgado em todos. O Outra Dança, por exemplo, divulga só programação artística, e só da capital. Mas pelo formulário você consegue enviar as ações formativas, e também editais e chamamentos, que entram, por exemplo, no escopo do MUD.
– Como eu entro em contato direto com os editores dos sites?
Com a cara de pau. Já ouvi várias vezes um “não sabia pra onde mandar”, “não sabia se podia te escrever”. Perguntar não ofende. Tá na dúvida? Escreve pelo contato dos sites, manda mensagem pelas redes sociais e pergunta como faz pra enviar, pra onde pode mandar. Cada um vai te responder sobre o que prefere e o que funciona. Aliás, essa lógica também vale com relação aos críticos de dança. Aproveito pra juntar esse ponto, porque sempre me perguntam “como faz pra convidar a comissão da APCA pra assistir meu espetáculo?”. E a resposta é simples: você convida. Não existe um contato oficial da comissão, ou um convite direto pra todos. Mas a cada votação a gente divulga quem está votando. Encontra essas pessoas pelas redes, e manda mensagem. Diz que quer convidar e pergunta como a pessoa gostaria de receber o convite. Simples assim.
– O que eu envio pra divulgação?
Tudo que você puder. O nosso formulário coloca todos os tópicos das informações que já sentimos necessidade. Claro que cada projeto tem uma realidade. Talvez você não tenha video de divulgação, talvez não tenha site. Mas tem alguma coisa. Manda o que tiver. Cada espaço lida com isso de forma diferente. Pro Outra Dança, é fundamental o serviço, e imagens. E por imagens eu digo fotos — não um card pronto de post de divulgação, não só o material que a companhia está circulando pelas redes. A foto mesmo, sem nada por cima. Tudo o que chega pra mim com essas informações básicas sobre pro site, e entra no post mensal de divulgação. Se tiver uma quantidade maior de fotos, se as fotos forem especialmente boas, e se o material inclui uns textos pra despertar interesse, ai tem chances de a apresentação também ganhar um post de divulgação só pra ela no Instagram do Outra Dança.
– Quando enviar divulgação?
O quanto antes. Todos os espaços que fazem divulgação periódica e em bloco têm algum plano pra essa frequência, normalmente ligada com a virada dos meses. Entra maio e eu divulgo o que tenho de programação de maio. Passou o posto mensal? Sua apresentação ainda pode entrar na agenda do site, e ainda pode até ter divulgação específica, mas perde aquele momento de associação com tudo o mais que está acontecendo no mês.
– Minha obra é estreia e não tem foto. Tudo bem?
Não. Faz uma foto. Uma foto conceitual, uma foto estilizada, uma proposta de imagem que conecte o público com aquilo que a obra vai ser. E quando tiver fotos de cena, ai atualiza, entra em contato de novo, envia mais material. Mas, por favor, faz foto. E de preferência mais de uma. E aproveitando o assunto, quando fizer fotos novas, envia fotos novas. Frequentemente eu não faço um post de divulgação de uma temporada só porque eu simplesmente não tenho fotos novas pra postar.
– Eu marquei o site na minha divulgação no Instagram, já não tá bom?
Não. Pode marcar, pode mandar mensagem, não tem problema usar as redes sociais. Mas o que eu preciso pra programação subir pro meu site não é isso. (E ai um ponto extra: o que eu preciso pra essa apresentação entrar na agenda do que eu vou assistir também é mais que isso). Aproveita essas formas mais práticas de contato pra saber o que e como cada site precisa. De novo, o formulário já dá conta disso tudo, mas conversar no pessoal pode ser ótimo, eu até prefiro. Só que os posts das redes sociais não dão conta. As vezes eu vejo programação pelo meu Instagram pessoal, que eu sei que eu não recebi divulgação. Mas eu vejo as redes em momentos à toa, descompromissados. Não é dali que vai entrar algo na minha agenda — nem na pessoal, nem a do site. Então precisa enviar diretamente, e pelos meios certos. Isso não quer dizer que as redes sejam desimportantes, pelo contrário. Mas ainda temos muito a fazer pra fortalecer redes de dança.
– O que colocar nos textos?
Essa pergunta normalmente vem de quem tá sem assessoria, mas como é um caso recorrente, vamos lá. A gente espera que um release conte sobre a obra. Ele pode ter textos poéticos e que falam dos temas e dos tratamentos estéticos que veremos na obra. Mas ele também precisa ser prático, direto, informativo. Ele precisa dizer do concreto da coisa. O que é esse trabalho, sobre o que é, quem fez, pra quem é… Ele precisa servir pra alguém ler e pensar “eu quero ver esse espetáculo de dança”, “essa obra de dança pode me interessar”. É muito difícil convidar alguém pra ver uma coisa que não sabemos o que é. E é isso que a comunicação é, em última instância. Um convite. E um convite pra uma coisa muito específica. Não é só “vamos marcar um café”. Isso aqui é uma festança. Precisa de toda a informação possível, pro convidado saber se interessa. Não é só dizer “é festa”. É festa de criança? Jantar? Roupa social? 10 pessoas ou 300? É numa fazenda, parquinho, salão, piscina, ao ar livre? Tem música ao vivo, de que tipo? Tem hora pra acabar? Pode levar acompanhante? — agora pensa isso tudo no equivalente pra sua obra. Fazer o convite certo é fundamental: você não quer que seu amigo chegue semi-nu, bêbado e pronto pra um bloquinho de carnaval na festa que é do batizado do seu sobrinho na casa da sua tia avó religiosa. Comunicação não é coisa solta. É comunicação com alguém. Com quem seu espetáculo quer conversar?
– Quem envia divulgação?
Todo mundo. Não espere só o trabalho do outro. Esse é um problema em todas as instituições, todo mundo tem equipe de menos, e tá sempre ficando buraco. É melhor receber a coisa três vezes, do artista, da assessoria, e do espaço, do que receber nenhuma — o que tem sido o caso.
– Eu preciso de ajuda pra fazer isso tudo?
Sim. Todo mundo precisa. Assessoria é o tipo de coisa que todo projeto devia ter, e em acompanhamento ao longo da realização, não só pra uma ação pontual. Não temos orçamento? Entendo bem o problema… Mas dentro do “estamos fazendo o que dá pra fazer”, cabe pensar em como cuidar desse aspecto. Senão, a gente continua dançando pra ninguém, ou só pras mesmas pessoas.
Pois bem… não é uma receita, mas tá ai uma lista de ingredientes e tem um tanto que dá pra cozinhar com eles. Seja como for, pense nessa comunicação. Não tem cabimento a gente reclamar tanto da falta de público, e da falta de interesse das pessoas na dança, se não fizermos o esforço de fazer os convites certos. Tem gente que pode estar interessada nisso. Mas as pessoas precisam saber que isso existe e como isso é. Bora comunicar, convidar, e levar mais gente pra ver dança.
O problema da comunicação é grande, e ainda tem um aspecto importante, que eu retomo na semana que vem. É sobre responsabilidade. De quem é a responsabilidade de comunicar a dança? — volta aqui semana que vem que a gente avança nesse debate.
* Henrique Rochelle é crítico de dança, membro da APCA, doutor em Artes da Cena, Professor Colaborador da ECA/USP, e editor do site Outra Dança.
*Este texto é de responsabilidade do autor e não reflete necessariamente a opinião do Portal MUD.