Esta e outras escritas sobre Jazz

Crédito das Fotos: Espetáculo

Esta e outras escritas serão (talvez) algo sobre jazz que você nunca ouviu, que ninguém nunca te contou e que se você dança/estuda jazz e sente o mínimo de curiosidade sobre isso poderão te ajudar em alguns questionamentos acerca de: por que o jazz que dançamos no Brasil se tornou tão diferente do jazz em sua essência? Por que existem tão poucos escritos sobre jazz no Brasil? Por que as pessoas não nos dizem que o jazz é uma dança negra?

Espero que esta e outras escritas sobre jazz possam te dar algo motivador, e que encorajem sua curiosidade. Elas são informações bem preciosas, que obtive na minha jornada em/com jazz, e que precisei me deslocar do país para poder ouvir falar e estudar com mais continuidade. Com sorte, elas te ajudem a não precisar passar pelo mesmo e a gente possa gerar esta e outras questões no Brasil.


O que torna isso jazz: afirmações iniciais.

Jazz loves music. That connection is deep, and heavy, and ancient. That’s why we perform with live music whenever possible.

Jazz loves gravity. It doesn’t try to pull away from it; it embraces it, and gets lower. It might lift out of it, leap, kiss the clounds, but it’s happiest when it’s low, close to the ground.

Jazz needs rhythm. It loves to sit in the groove, but also to be off balance, to push and pull time, in between beats, syncopated and free until it falls back into whatever that groove may be.

Jazz uses the torso, which is the endless source of our movement. It comes right from the centre of the chest, the place where you feel, ache, burst. The place where “cool” lives in your body.

Jazz loves to improvise. Your body is your instrument: you must know how to play it, you must be able to have conversations with it, to make it say what you want to say, how you want to say it, and also how to make it listen.

Jazz is personal, it needs you to be you. It’s about people with personalities and inteligence and life. You are going to feel this think this dance – this maybe a little differently than me because you have had a diferente experience than mine, and jazz thrives on that. (Cooper, 2013)

O texto acima escrito pela artista Kimberley Cooper[1] me vem convocado na tentativa de situar você, que me lê – e por isso não o traduzi –, para quais contextos o jazz aqui é apresentado e por quais lugares eu costumo o trabalhar. Conheci Kimberley em 2012 e desde então aprendo sobre jazz com ela e a Decidedly Jazz Danceworks (DJD), companhia canadense de jazz que tive o prazer de ser dançarino nos anos de 2014 e 2015.  

A DJD foi criada em uma tentativa de recuperar elementos que não são facilmente ensinados, principalmente coisas que decorrem da essência e espírito do jazz e são mantidos em suas raízes afro-americanas. A missão é entrar nesse espírito. As maneiras em que o espírito pode ser manifestado são absolutamente infinitas. O jazz abrange um amplo espectro e se hibridizou com muitas outras danças ao longo dos anos, mas qual é a essência do jazz?

Para a Vicky Willis[2], é sobre a vida. Toda a vida, humanidade, animais, espíritos, daqui e agora para mundos de fantasia. É sobre sentimentos, sensações, emoções, alma. É claro que noções conceituais podem certamente ser tecidas no processo, mas não podem apagar a alma autêntica e o espírito de uma obra de jazz. Elimine a humanidade na viagem cinestésica e você elimina o jazz é a opinião dela[3]. Ela tem muitas vezes dito a pessoas preocupadas sobre se seu movimento é jazz ou não: “Se você se encontrar em um bom pedaço de música jazz, o movimento será jazz”. E eu era uma dessas pessoas. O desafio é encontrar esse lugar profundo e se conectar a ele. Mas a gente tem aula de jazz dance com música jazz?

Aniele Lemos (2018) nos lembra que por carregar consigo matrizes estéticas africanas, o jazz traz diversas características destas danças. Dentre elas os pés deslizando em contato ao solo, o movimento centrífugo partindo dos quadris para as extremidades, o ritmo propulsivo, a musicalidade, o balanço (swing) e a mobilidade do tronco. Mas será que vemos coisas assim nas aulas de jazz ou nas performances no palco?

Patricia Cohen (2015), ao tentar falar sobre ele, elaborou um termo muito legal chamado CONTINUUM, estabelecido pela continuidade histórica, cultural, social e cinética dessa forma afro-americana de dançar. Sem dúvida o jazz dance é uma mistura de duas culturas/povos (preto e branco) derivadas de suas raízes na África Ocidental, cujas músicas e danças são aspectos da vida cotidiana. Uma vez que aceitamos o forte relacionamento entre as danças das culturas africanas tradicionais e as danças dos negros americanos, e sua influência na dança social, popular e teatral, o continuum é estabelecido.
jazz vernacular se desenvolveu com os tempos nas plantações e depois na guerra civil. Ele ganhou muito durante a primeira metade do séc. XX para incluir elementos da dança africana e europeia, e continua se desdobrando atualmente. Patricia define tais elementos na natureza do jazz dance como: SOCIAL (círculo; a comunidade; criatividade singular dentro do grupo; incentivo vocal; não separação entre intérpretes e expectadores; desafios entre us dançarines; confronto; alegria; chamada e resposta; interação entre músicos e intérpretes); e CINÉTICO (uso do pé flexionado; articulações do quadril, joelho e tornozelos dobradas; tronco articulado e inclinado, isolamento de partes do corpo; aterramento; improvisação; embelezamento e elaboração; polirritmias e síncopes; policentrismo; angularidade e assimetria; expressão pessoal e criatividade).

REFERÊNCIAS:

https://www.decidedlyjazz.com/

LEMOS, Anielle. As transformações do jazz dance: um recorte histórico da diáspora afro-americana até os dias atuais. In: X Congresso da ABRACE, Natal. Anais, v. 19, n 01, 2018.

GUARINO, Lindsay; OLIVER, Wendy. Jazz Dance: A history of the roots and branches. University Press of Frorida, 2015.

*Este texto é de responsabilidade do autor e não reflete necessariamente a opinião do Portal MUD.


[1] Kimberley Cooper é diretora artística e coreógrafa principal da Decidedly Jazz Danceworks (DJD) em Calgary, Canadá. Em 2002, Cooper foi nomeada Artista Emergente do Ano pela Alberta Dance Alliance e, desde o mesmo ano, ela criou 18 obras completas na DJD, bem como várias peças mais curtas. Ela também atuou como Artista Residente em Calgary como Capital Cultural do Canadá em 2021, e recebeu o Prêmio Dance Victoria’s Crystal em 2014 por sua pesquisa no Brasil. Além disso, Cooper escreveu um capítulo no livro City of Animals para o Departamento de Humanidades da University of Calgary sobre o New Universe, um trabalho que ela criou com o baixista e compositor de jazz americano William Parker em 2017. (Fonte: site oficial da DJD)

[2] Vicki tem uma tradição familiar que começou quando sua mãe, Alice Murdoch Adams, abriu uma das primeiras escolas de dança em Calgary, em 1920. A paixão de Vicki pela dança e pelo jazz levou-a literalmente por todo o mundo. Além de ensinar e coreografar para inúmeras organizações locais e internacionais, incluindo a renomada Escola de Jacob ‘s Pillow, ela fundou a Divisão de Jazz no Programa de Dança da Faculdade de Belas Artes da Universidade de Calgary em 1978, e co-fundou a Decidedly Jazz Danceworks em 1984, onde continuou seu papel como diretora artística. Atualmente, ela está abraçando com entusiasmo seu novo papel de Fundadora em Residência na organização. (Fonte: site oficial da DJD)

[3] Conversas trocadas por e-mail entre mim e Vicki.

Rubéns Lopes

Rubéns Lopes

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É artista, professor e pesquisador em/com danças formado pelo Curso Técnico em Dança (senac/IACC/Secult), e pela Licenciatura em Dança (UFC). Atualmente é mestrando em artes no PPGArtes do IFCE, diretor da Cia Anagrama (Fortaleza/CE), ccoordenador do Programa de Entensão em Danças Africanas Ancestrais no IFCE e professor no Curso Técnico em Dança (Porto Iracema e Centro Cultural do Bom Jardim), na Escola Livre Balé Baião (Itapipoca/CE) e na Escola O Casulo. Rubéns foi sapateador na Companhia dos Pés Grandes (Fortaleza/CE) e bailarino na Decidedly Jazz Danceworks (Calgary/Canadá). Na área social constrói o Movimento Negro Kalunga, o Fórum de dança do Ceará, e o Núcleo de Estudos Afro Brasileiros e Indígenas – Neabi Fortaleza, ambos trabalhando o empoderamento/pertencimento negro através da arte.