Um olhar que atravessa a plateia

Crédito: Léo Pinheiro @c41estudio / @cultsppro

Por Flávia Fontes Oliveira

Em Voyeur, coreografia de Lili de Grammont, dançada pela Companhia de Dança de São José dos Campos, há um jogo entre quem observa e quem é observado, dentro e fora da cena. O trabalho encerrou o programa da noite do dia 29 de novembro de 2025, da Mostra de Dança CULTSP PRO, Programa de Qualificação em Artes, no teatro da Casa de Cultura Cine Santana.

Com doze bailarinos, trilha sonora original de Ed Côrtes, a orientação artística do Programa Qualificação foi da performer e coreógrafa Lívia Seixas. O trabalho, que estreou em 2016 no Balé da Cidade de São Paulo,, foi remontado para o grupo de São José dos Campos este ano, com elevado rigor e exigência técnica do elenco.

Não por acaso, em agosto, já participando do Qualificação, ao fazer sua estreia internacional, no Fringe Festival, em Edimburgo (Escócia), reiteradas críticas apontaram para a habilidade dos intérpretes, a inventividade da coreografia e a beleza das imagens. Essas apresentações aconteceram com apoio do programa São Paulo Showcase – Ano da Cultura Reino Unido-Brasil 2025-26, da Secretaria da Cultura, Economia e Indústria Criativas do Estado de São Paulo via Lei Aldir Blanc, gerido pela APAA.

Na apresentação em São José dos Campos, com elenco completo, o início de Voyeur tem doze cadeiras em fila na boca de cena, vazias. Um a um, os bailarinos entram e buscam um lugar nas cadeiras, em um indo e vindo de situações coreográficas. Sem um caminho convencional, a sequência mostra o desafio dos bailarinos para ocupar todos os lugares e eles não perdem seu olhar fixo e desafiador dirigido ao público.

Eles seguem assim até o solo inicial de uma bailarina, de movimentos fortes, precisos e elaborados. Essa dinâmica dará o tom de todo espetáculo, em diferentes formações, conjuntos, duos, solos, entre outros. Nesse início,  já é possível ver articulação das soluções gestuais e a unidade do elenco.

Crédito: Léo Pinheiro @c41estudio

É preciso destacar o refinamento dos duos e de um quinteto dançado por três mulheres e dois homens, que estão sempre no limite do brusco e intrincado: há sempre uma tensão, um enfrentamento, mas é preciso intimidade para encontrar caminhos para os movimentos.

As cadeiras nunca saem de cena, ocupam diversos lugares no palco e servem como espaço de observação: quem não dança divide com o público o olhar. Mas esse jogo é ainda mais elaborado, não há quem não seja observado, até mesmo quem está na plateia.

A assinatura de Lili de Grammont é visível em trabalhos como esse, assim como o cuidado cênico de suas criações, uma linha perceptível de sua formação como bailarina no Balé da Cidade de São Paulo e os inúmeros encontros de coreógrafos nacionais e internacionais de uma companhia de repertório como essa. Nesse sentido, participar do Qualificação em Artes, CULTSP PRO, gerido pelo idg  – Instituto de Desenvolvimento Social, é uma chance de se apoiar na raiz de sua formação, com inúmeras trocas artísticas, sem perder a essência de sua linguagem. Essa é a grande riqueza de projetos como esse.

Crédito: Léo Pinheiro @c41estudio

 

Crédito: Ronny Santos

Flávia Fontes Oliveira. Jornalista e roteirista. É autora e roteirista do projeto Tempo de Dança (Origina Conteúdo, em cartaz no canal Arte1). Também colabora com o jornal Valor com matérias sobre dança. Trabalhou na Gazeta Mercantil, Revista Época (semanal), foi redatora-chefe na Editora Trip e coordenadora das áreas de Comunicação, Educativo e Memória na São Paulo Companhia de Dança. Já fez matérias sobre dança em diversos veículos como as revistas Bravo!, Fapesp, CartaCapital, TAM, Voe Gol, entre outras. É autora de artigos como Texturas da Memória (in: Sala de Ensaio, Imprensa Oficial| SPCD, 2010. Co-organizadora do livro Na dança (Imprensa Oficial, 2005). É mestre em comunicação pela PUC/SP, com dissertação sobre a dança em São Paulo. Como roteirista, em ficção, fez parte da equipe de roteiro da série Chuva Negra, de Rafael Primot. Participou da equipe de roteiro do programa Me deixa dançar (Moonshot Pictures – GNT); da temporada 2 e 3 do programa Menos é Demais (Discovery Home & Health).

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Como parte das estratégias da Mostra de Dança PQA CULTSP PRO (28 a 30 de novembro de 2025/ São José dos Campos/Casa de Cultura Cine Santana), esta resenha foi escrita para ampliar- mediante um profissional olhar crítico sobre as obras nela apresentadas – as ações do PQD, programa de formação profissional, inovação e sustentabilidade, criado pela Secretaria da Cultura, Economia e Indústria Criativas, gerido pelo Instituto de Desenvolvimento e Gestão – idg. O PQD tem Coordenação de Cássia Navas, Supervisão Artística de Samuel Kavalerski e Monitoria de Bia Fonseca. O CULTSP PRO tem Sérgio de Azevedo como Gerente Geral de Formação e Raquel Verdenacci como Diretora.

Esta publicação é uma parceria entre o CULTSP PRO e o Portal MUD, sendo as visões nelas expressas exclusivas de sua autora.

Programa de Qualificação em Dança

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Concebido para aproximar artistas, mediante a orientação de grupos, companhias e coletivos de todas as formas da dança no estado, o PROGRAMA DE QUALIFICAÇÃO EM DANÇA alarga seus contornos ao investir diretamente em territórios estruturados e/ou em estruturação da arte, cultura, indústria e economia criativas. Para isto, ambém estabelece especiais circuitos de circulação e validação da dança atual, também em mostras regionais e estaduais.