Crédito: Léo Pinheiro @c41estudio / @cultsppro
Por Flávia Fontes Oliveira
Como investigar a disputa, o individualismo, o embate entre espaços e corpos em um mundo dividido e violento? Nesse contexto, as danças urbanas podem sugerir resistência. Essas foram ideias que guiaram a criação de Ocupação – Corpos em Atrito, da Companhia Viela de Danças Urbanas da cidade de Registro, dirigida por Emerson Trankas. A apresentação aconteceu na primeira noite da Mostra de Dança CULTSP PRO, Programa de Qualificação em Artes, no dia 28 de novembro, na Casa de Cultura Cine Santana, em São José dos Campos.
A coreografia, assinada por Emerson Trankas, teve orientação artística de Evandro Hegel, pesquisador de dança com ênfase em danças urbanas, em uma parceria proposta pela equipe do Qualificação, Cássia Navas e Samuel Kavalerski, que se mostrou rica porque gerou caminhos de pesquisa e feliz porque o resultado tirou o tema de formulações convencionais.

Crédito: Léo Pinheiro @c41estudio
O encontro entre os dois artistas articulou a exploração do espaço e do tempo cênicos com a técnica e a virtuosidade das danças urbanas, em particular o Breaking. A partir dessa investigação, a primeira decisão que chama atenção é o uso do tempo como recurso dramatúrgico.
O espetáculo se inicia com o trio de intérpretes, formado por Alexandra Rangel, Denis Linsalém e o próprio Trankas, em cena e parados, olhares fixos no público, com a luz desenhada por Melissa Guimarães, que também assina a coordenação técnica da Mostra, marcando suas posições. Ao iniciar a música, permanecem um tempo estáticos, para só aos poucos começarem a se mover.
Os movimentos são lentos, contrariando a expectativa do que se espera inicialmente da explosão das danças urbanas. O tempo, alongado e controlado, muda em determinados momentos, com o ataque das sequências. Essa dinâmica temporal está presente durante a coreografia, de cerca de trinta minutos, em diferentes formatos, solos, duos ou trios, e intensidades: alternando momentos lentos com mais fortes e virtuosos ou mais coreografados.

Crédito: Léo Pinheiro @c41estudio
Entre esses momentos de extensão do tempo, os três intérpretes não deixam de explorar a movimentação das danças urbanas: o virtuosismo existe, aparece, mas não é superior à ideia, ao conjunto da criação. Há momentos que dançam separados ou em conjunto, equilibrando o uso do tempo. Uma sequência dançada por Trankas, sem música, cruza o palco com modulações entre o solo e a vertical, e cria um ritmo de som com seus próprios movimentos.
O grupo foi criado em 2014 e Ocupação Corpos em Atrito é seu quinto trabalho. Emerson Trankas já esteve no Programa Qualificação em Dança em outras edições, retomou com a companhia em nova formação (Rangel e Linsalém estrearam pela primeira vez em um palco durante a Mostra) e o desejo de também reaver o caminho como dançarino.
Com uma atuação constante na cidade de origem, a nova coreografia trouxe respostas para os questionamentos iniciais do projeto com a resistência de seus próprios corpos. O encontro entre os artistas apostou em questionamentos, em deslocamentos de ideias e uma influência mútua frutífera.

Crédito: Léo Pinheiro @c41estudio

Crédito: Ronny Santos
Flávia Fontes Oliveira. Jornalista e roteirista. É autora e roteirista do projeto Tempo de Dança (Origina Conteúdo, em cartaz no canal Arte1). Também colabora com o jornal Valor com matérias sobre dança. Trabalhou na Gazeta Mercantil, Revista Época (semanal), foi redatora-chefe na Editora Trip e coordenadora das áreas de Comunicação, Educativo e Memória na São Paulo Companhia de Dança. Já fez matérias sobre dança em diversos veículos como as revistas Bravo!, Fapesp, CartaCapital, TAM, Voe Gol, entre outras. É autora de artigos como Texturas da Memória (in: Sala de Ensaio, Imprensa Oficial| SPCD, 2010. Co-organizadora do livro Na dança (Imprensa Oficial, 2005). É mestre em comunicação pela PUC/SP, com dissertação sobre a dança em São Paulo. Como roteirista, em ficção, fez parte da equipe de roteiro da série Chuva Negra, de Rafael Primot. Participou da equipe de roteiro do programa Me deixa dançar (Moonshot Pictures – GNT); da temporada 2 e 3 do programa Menos é Demais (Discovery Home & Health).
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Como parte das estratégias da Mostra de Dança PQA CULTSP PRO (28 a 30 de novembro de 2025/ São José dos Campos/Casa de Cultura Cine Santana), esta resenha foi escrita para ampliar- mediante um profissional olhar crítico sobre as obras nela apresentadas – as ações do PQD, programa de formação profissional, inovação e sustentabilidade, criado pela Secretaria da Cultura, Economia e Indústria Criativas, gerido pelo Instituto de Desenvolvimento e Gestão – idg. O PQD tem Coordenação de Cássia Navas, Supervisão Artística de Samuel Kavalerski e Monitoria de Bia Fonseca. O CULTSP PRO tem Sérgio de Azevedo como Gerente Geral de Formação e Raquel Verdenacci como Diretora.
Esta publicação é uma parceria entre o CULTSP PRO e o Portal MUD, sendo as visões nelas expressas exclusivas de sua autora.
Programa de Qualificação em Dança 