Notas de Dança, n.1

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NOTAS
N.1
DE DANÇA

IARA BIDERMAN é jornalista, crítica e repórter de dança. É editora da Quatro Cinco Um - a revista dos livros, membro da comissão de dança da APCA, criadora do blog Deu Baile, editora do site Na Dança! e colaboradora do jornal Folha de São Paulo.

JANE OLIVEIRA é professora, artista plástica, pesquisadora em dança e autora do livro “Martha Graham e a Dança Moderna: na linha de frente do movimento progressista” (ANDA Editora, 2022).

ALBERTO MAGNO é bailarino, professor e artista visual. Foi programador do FESTIVAL DA FÁBRICA (PT), curador do Festival FRAME RESEARCH (PT) e criador do MAP/P Mostra de Processos (PT).

SIMONE MAGGIO é jornalista e bailarina, formada em Publicidade e pós-graduada em Gestão Cultural. Tem se dedicado a fotografia, com especial interesse na fotografia de dança.

TONO GUIMARÃES é formado em Letras e pesquisador de Literatura, História e Filosofia. Atua como dramaturgista, pesquisador, criativo e produtor cultural de Dança.

EXPEDIENTE

ou o diálogo entre dança e cinema ao vivo

TAKE 1 … 2 … 3 … AÇÃO!

TOMIE OHTAKE:

DANÇANTE FESTIVAL DANÇA

EM FOCO 2022

ACIDENTES DE PERCURSO

Entrevista com Geraldo Si

Fotografias de Simone Maggio

APRESENTAÇÃO
A DANÇA LEVA CONSIGO INOVAÇÃO E INFORMAÇÃO
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APRESENTAÇÃO

Notas de danças e algumas notas sobre o CRD

Notas de dança é uma revista feita por pessoas da dança, das letras, das imagens, dos bastidores e da “cena” –para usar uma palavra na qual cabem muitas coisas ou interpretações. Porque é isso mesmo: uma das (muitas) dificuldades de escrever sobre dança é descobrir o recorte nessa imensidão que nos possibilita falar algo sobre uma arte que manifesta o que as palavras não dão conta de expressar.

Várias vezes, entrevistando artistas da dança sobre suas criações, ouvi deles que não havia o que falar (ou explicar) sobre a obra, tudo o que precisava ser “dito” estava na realização/apresentação e na “leitura”, mesmo que sem palavras, de cada espectador. Mas a gente quer falar sobre dança, ouvir, ler, pensar com o corpo mas também com a racionalidade (sempre restritiva) das palavras.

Esse é o começo do jogo para a escrita da dança. Mas na oficina A dança no Jornal havia mais restrições. A proposta da oficina e desta revista é escrever para um público amplo, geral e irrestrito, muitas vezes não familiarizado com os jargões acadêmicos ou com as referências da crítica especializada. Parece, mas não é simples.

Para chegar a esta revista, tivemos oito encontros no Centro de Referência da Dança da Cidade de São Paulo. Usamos algumas salas e até o espaço cênico do CRD-SP, conforme a disponibilidade: no mesmo horário de nossos encontros, outras oficinas estavam sendo realizadas, grupos ensaiavam, aulas eram dadas. Ver o CRD funcionando, preenchido por dança, é um alívio. Porque não foi fácil conquistar este espaço, assim como não é fácil encontrar espaço para a dança – seja na pauta dos teatros, seja na pauta dos jornais e da mídia em geral.

O CRD-SP começou com uma demanda do movimento da dança para transformar o espaço antes ocupado pela antiga Escola Municipal de Bailado (atual Escola de Dança de São Paulo), transferida para a Praça das Artes no final de 2013, em um centro de referência destinado à dança. Coordenado pela Cooperativa Paulista de Dança, o movimento discutia a proposta com a Secretaria Municipal de Cultura enquanto o local era ocupado por artistas de rua e coletivos. A ocupação foi considerada ilegítima pela prefeitura e os ocupantes foram retirados do local em junho de 2014. Um mês depois, a SMC anunciou a implantação do projeto do CRD. A Cooperativa Paulista de Dança foi conveniada para a gestão do projeto em fase experimental.

O projeto piloto de implantação durou de agosto de 2014 até dezembro de 2015. A partir de fevereiro de 2016, começou o projeto Centro de Referência da Dança da Cidade de São Paulo – Para Além da Consolidação. Selecionada por um chamamento público, a gestão compartilhada do CRD ficou a cargo da mesma Cooperativa, que esteve na gestão até agosto de 2017, seguida pela associação Corpo Rastreado, até o início de 2019.

Era um modelo inédito de gestão que, mesmo sendo gerida por um terceiro, tinha a participação ativa de um colaborador da SMC nas decisões.

Em 2019, o modelo de gestão compartilhada mudou e o CRD passou para a administração direta da Secretaria Municipal de Cultura. Após alguns debates e articulações dos movimentos de dança, chegou-se a um novo modelo de gestão mista, no qual projetos selecionados por edital são responsáveis pelo eixo artístico-pedagógico (cursos, oficinas) por períodos determinados. Esse eixo ficou a cargo da Cooperativa Paulista de Dança de 2020 a 2021, com o projeto Transversalidades Poéticas, e com a Corpo Rastreado em 2022, com o Circuito de Afetos.

A oficina que deu origem a Notas de Dança faz parte do Circuito de Afetos, projeto de construção de conhecimentos com atividades destinadas à criação, à experimentação, à pesquisa, à reflexão sobre o fazer dança e suas conexões com outras linguagens.

Notas de Dança também faz essas conexões, não só na forma: os conteúdos, como você verá a seguir, falam das várias interações e conexões que permeiam a dança contemporânea. Boa leitura.

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TAKE 2, Jorge Garcia Cia. de Dança, FT: Sílvia Machado

AÇÃO!

ou o diálogo entre dança e cinema ao vivo

O uso da imagem em cena, no teatro, na dança, na ópera, desperta o interesse pelas várias possibilidades do uso da imagem e dos equipamentos (softwares, hardwares e aplicativos), trabalhando em conjunto com a atuação ao vivo de atores, músicos, bailarinos, artistas da ópera, e muito mais; criando uma dança com inúmeros intérpretes!

O coreógrafo Jorge Garcia desenvolve há bastante tempo, uma pesquisa continuada baseada no binômio dança e multimídia. O trabalho conjunto entre essas linguagens surge em várias obras do coreógrafo, como vídeos-dança e peças cênicas, e em suas contribuições com outros grupos e artistas que também exploram criativamente esse trabalho conjunto de duas áreas criativas distintas, como o coletivo GRUA.

Sua série de trabalhos intitulada TAKE 1 / TAKE 2 e agora, TAKE 3, que estreou em setembro deste ano, traduz essa pesquisa do uso da imagem bidimensional a partir da captação e projeção de imagens da própria performance realizada ao vivo.

O coreógrafo baseia a sua pesquisa na noção de plano sequência. Um plano único de captação de imagem, contínuo; que aborda várias ações de uma mesma narrativa. E depois a sua projeção direta, contando somente com o delay próprio da transmissão da imagem.

acurada de determinadas relações e procedimentos que estão em jogo na Coreocinegrafia. Na Trilogia em Coreocinegrafia, a Jorge Garcia Companhia de Dança investiga novas perspectivas para uma proposta cênica e fílmica, que borra os limites entre as linguagens da Dança e do Vídeo e propõe experiências bastante únicas aos seus espectadores.

Não se trata apenas da gravação de um filme longametragem, tampouco de uma coreografia de dança contemporânea. É justamente essa fusão, que subverte as noções do que é ou não cena, que tem atraído diversos tipos de público e provocado bastante interesse para isso que a Companhia vem chamando de COREOCINEGRAFIA.

“O ato de fazer um filme, ao vivo, aperfeiçoando e refinando nosso entendimento técnico, estético e dramatúrgico, faz com que a narrativa construída seja potencializada a cada espetáculo.”

O ato de fazer um filme, ao vivo, aperfeiçoando e refinando nosso entendimento técnico, estético e dramatúrgico, faz com que a narrativa construída seja potencializada a cada espetáculo. Em cena, sete intérpretes dançam, filmam, operam equipamentos e apoiam-se mutuamente na construção do acontecimento. O público pode assistir, em tempo real, a gravação de um filme, cujas cenas se encadeiam fluidamente e estão baseadas em coreografias, jogos cênicos e improvisações orientadas.

Se antes, a arquitetura, as linhas de força do espaço e o trânsito do público eram parte essencial da dramaturgia do trabalho, agora, o isolamento dos agentes que produzem esse acontecimento permite uma visão mais

Esse gênero artístico performático vem sendo desenvolvido ao longo dos últimos anos de produções da companhia, tendo sua primeira materialização cênica em “Take a Deep Breath” (2016). Coreocinegrafia é um pensamento coreográfico que acontece na concomitância entre o que é dançado, o que é filmado, o ato de produzir um filme e a transmissão e visualização do produto audiovisual (captação em tempo real) para os espectadores.

É importante mencionar que o público participa e acompanha todos os três elementos/processos/secções da performance/evento/ espetáculo.

Esse gênero artístico performático vem sendo desenvolvido ao longo dos últimos anos de produções da companhia, tendo sua primeira materialização cênica em “Take a Deep Breath” (2016). Coreocinegrafia é um pensamento coreográfico que acontece na concomitância entre o que é dançado, o que é filmado, o ato de produzir um filme e a transmissão e visualização do produto audiovisual (captação em tempo real) para os espectadores.

É importante mencionar que o público participa e acompanha todos os três elementos/processos/secções da performance/evento/espetáculo..

TAKE 1 … 2 … 3 …
NOTAS DE DANÇA N.1
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TOMIE OHTAKE: DANÇANTE

Coreógrafos de estilos e gerações diferentes mergulham na obra da artista nipo-brasileira

Um artista negro inteiramente vestido de branco se desloca agachado ao redor de um grande círculo de sal grosso. O público é restrito e o espaço é habitado por memórias e obras de arte. Estamos numa noite fria de setembro e o coreógrafo Allyson Amaral apresenta seu trabalho em um ensaio aberto numa sala que um dia já foi o ateliê de Tomie Ohtake. As curvas, ondas e movimentos da obra da artista nipo-brasileira são a inspiração para essa e outras danças no projeto Tomie Ohtake: Dançante, que faz parte da comemoração dos 20 anos do Instituto Tomie Ohtake. As apresentações ocorrem em sintonia com uma grande exposição retrospectiva “dividida em 3 atos, 3 ambiências que conjugam seleções de pinturas de Tomie Ohtake com recursos expográficos escolhidos para intensificar a consciência sinestésica do corpo, do espaço e do movimento”, destacam os curadores Paulo Miyada e Priscyla Gomes. Segundo Gomes, o projeto originou-se da intenção de buscar novos caminhos para apresentar a obra de Tomie Ohtake para o público brasileiro. Para tanto, coreógrafas e coreógrafos brasileiros de estilos, gerações e origens diferentes foram convidados a mergulhar no universo dessa grande artista plástica e produzir obras originais de dança na casa onde a artista viveu e trabalhou, desde os anos 1970 até sua morte. Desenhada por Ruy Ohtake, a casaateliê é um lindo espaço modernista no improvável bairro do Campo Belo, onde vemos uma riqueza de maquetes, quadros e esculturas produzidas por Tomie, em diversas fases dos seus sessenta anos de trabalho artístico, convivendo lado a lado com obras de outros artistas, num ecossistema que sugere encontros e influências. Com esse projeto, que envolve a apresentação de ensaios abertos na própria casaateliê, o espaço retomou sua potencialidade para ser um local de criação artística e encontro para os amantes da arte. Os ensaios e a vivência na casa-ateliê possibilitam aos artistas da dança uma aproximação com a extensa obra da artista plástica e suas referências.

As apresentações finais, entretanto, ocorrerão no próprio instituto, integradas à exposição Tomie Dançante. A curadora destaca que essa transposição entre espaços tem sido desafiadora para os coreógrafos pois “envolve cenografia, iluminação e, em muitos casos, uma adaptação da própria coreografia”. Tudo isso como parte desse processo de criação, recriação e transformação que homenageia e revela o legado da artista plástica. “Há algo de pulsante nesses encontros, que torna tudo mais vivaz”, diz Priscyla Gomes. Além da exposição e das apresentações, o público que comparecer ao Instituto poderá também assistir aos registros em vídeo, na íntegra, dos ensaios abertos realizados na casa-ateliê, na mostra Tomie Ohtake Ensaios. A curadoria desse espaço, que incluirá também gravuras e fotografias de obras públicas de Tomie, é assinada por Paulo Miyada, Priscyla Gomes, Diego Mauro e Julia Cavazzini. Segundo os curadores, “se os ensaios são uma réplica (ou seja, uma resposta) à obra da artista, a exposição apresentada é uma tréplica: por meio desta seleção de trabalhos, Tomie Ohtake responde à dança. Assim, dança, pintura, escultura somadas a gravuras e maquetes de obras públicas estabelecem formas de fricção e contágio”. Os artistas da dança envolvidos no projeto Tomie Ohtake: Dançante são Allyson Amaral, Cassi Abranches (Balé da Cidade), Davi Pontes, Eduardo Fukushima e Bia Sano, Emilie Sugai e Rodrigo Pederneiras (Grupo Corpo). O projeto tem patrocínios do Bradesco, na cota Apresenta, e da Motorola, na cota Ouro. Vale a pena ficar atento ao cronograma das apresentações e visitar a exposição.

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NOTAS DE DANÇA N.1
Jane Oliveira
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Tomie Ohtake: Dançante - de 16/11/2022 a 19/03/2023, de terça a domingo, das 11h às 20h, entrada franca. Abertura 16/11, às 19h

Dia 21/11, às 19h: Emilie Sugai, com direção de Lee Taylor

Dia 26 e 27/11, às 19h: Rodrigo Pederneiras

Dia 10/12 (horário a definir): Allyson Amaral com dramaturgia de Haroldo Saboia

As apresentações seguintes ocorrerão nos primeiros meses de 2023 (datas a definir).

Brigadeiro Faria Lima, 201, Pinheiros, São Paulo – SP
05426-100 Entrada pela Rua Coropés, 88. Telefone: 11 2245 1900 www.institutotomieohtake.org.br ENSAIO
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Instituto Tomie Ohtake Av.
CEP
ABERTO, Davi Pontes, FT:

Entre o corpo e o sal grosso

No chão um grande círculo de sal grosso cria um espaço estranho para a dança de Allyson Amaral, que circula agachado em torno desse território pedregoso enquanto o público se ajeita na sala pouco iluminada. Nas paredes, quadros de Tomie Ohtake: formas geométricas, curvas, cores. O movimento ritmado e intermitente de Allyson estabelece uma música própria do corpo, que nos leva para esse mundo estranho. Quando a sala se acalma, o artista negro todo vestido de branco invade o território salgado e nele desenha, modela e esculpe. Há uma conversa entre as formas que vemos nos quadros espalhados nas paredes e as que vão se revelando nessa interação corposal que ativa a imaginação dos convidados presentes nesta sala, que um dia foi o ateliê de Tomie Ohtake. Com dramaturgia de Haroldo Saboia, o solo de Allyson Amaral incorpora elementos marcantes da estética da artista nipobrasileira. A capacidade de concisão, muitas vezes chamada de minimalismo, é um dos pontos fortes da obra dessa artista tão brasileira quanto japonesa. As ondas, por exemplo, estão por toda parte na obra de Tomie Ohtake. Ao entrar nesse universo e se deixar contaminar por ele, Allyson Amaral e Haroldo Saboia perceberam que era preciso encontrar o máximo no mínimo, evocar diálogos e relações sem sobrecarregar as imagens. A escolha desse material simples e polissêmico não poderia ser mais acertada. Com o movimento do corpo e as mudanças sutis de iluminação vemos o sal virar neve, gelo e montanha, e até evocar o famoso monte Fuji. O artista vira astronauta, trabalha, constrói e reconstrói o espaço que ocupa. Em certos momentos visitamos um labirinto, em outros estamos em ambiente lunar. Nenhum mundo é definitivo, tudo é processo, transformação.

Logo percebo que não são só as formas e desenhos que me afetam. O som ritmado e a textura desse sal me lembram o mar, a pesca, as travessias marítimas, as distâncias Brasil – Japão –África. Uma criança ao meu lado se espicha e pega uma pedra de sal depois de um mergulho de Allyson. Os atravessamentos são muitos e não são óbvios. Em certos momentos, por exemplo, Allyson para e parece se lavar, evocando os rituais de purificação e o mundo encantado pela ancestralidade das religiões de origem africana. Espaços e tempos se sobrepõem, convivem e se chocam. Nossa história se revela na arte em processo.

O solo que Allyson nos apresentou neste ensaio aberto é uma dança de trabalho e transformação, onde o passado se revela presente e as paisagens do futuro, às vezes estranhas e inóspitas, se revelam flexíveis e maleáveis, sempre passíveis de transformação. Anote na agenda: dia 10 de dezembro no Instituto Tomie Ohtake. Quem for, certamente sairá de alma lavada.

ENSAIO ABERTO, Allyson Amaral, FT: Ricardo Miyada

FESTIVAL DANÇA EM FOCO 2022

Edição 2022 de

um dos principais festivais de vídeos-dança

do mundo começa dia 25 de novembro no Rio de Janeiro

O “Dança em Foco” - Festival Internacional de Vídeo & Dança, nasceu em 2003, no Rio de Janeiro, como o primeiro evento brasileiro de desenvolvimento da interface entre o vídeo e a dança; hoje, é reconhecido como um dos principais festivais de filmes de dança do mundo. Através de suas ações, ele se firmou como ponto de referência e o principal contexto para a divulgação e desenvolvimento da produção de videodança no país. Desde a criação do dança em foco, em 2003, assistimos a um aumento das criações para vídeo estabelecendo um outro espaço possível para a videodança brasileira e mundial, com inúmeras edições online; ao longo da pandemia, a tela foi tomada como o único espaço possível para fazer e fruir dança. A criação da dança para vídeo multiplicou suas poéticas e as obras cresceram exponencialmente, em quantidade e qualidade. O dança em foco permanece e segue ocupado com a abertura de espaços para que nossos corpos, imagens e movimentos se entreteçam e produzam novas redes. A curadoria do festival em 2022 está a cargo dos curadores e pesquisadores da interação entre a dança e ao vídeo, Paulo Caldas e Leonel Brum.

Um dos artistas selecionados é o diretor e coreógrafo francês Didier Mulleras, com seu vídeo COLONY. Didier Mulleras foi um dos pioneiros na utilização da internet como meio de difusão de obras multimídia que envolviam a dança e o vídeo; quando lançou em 2000 o seu projeto Mini@tures. COLONY, o vídeo com o qual participa do festival, já possui uma extensa lista de apresentações e premiação em festivais internacionais, como por exemplo, SEOUL International Short Film Festival (Coréia do Sul), Macroproject Film Festival (New York/USA), London Screen Power Film Festival (Inglaterra). Segundo o coreógrafo Didier Mulleras, COLONY

“… é um grupo de indivíduos que vive e interage de perto uns com os outros, normalmente para obter benefícios próprios, como por exemplo, a auto defesa.”

DANÇA EM FOCO

De 25 a 27 de novembro, no Centro Coreográfico da Cidade do Rio de Janeiro.

Rua José Higino 115 – Tijuca

Dança em Foco

http://dancaemfoco.com.br/ @dancaemfoco

NOTAS DE DANÇA N.1
Alberto Magno
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ACIDENTES DE PERCURSO

Geraldo Si, ex-bailarino de Pina Bausch, ministrará duas oficinas em São Paulo em dezembro

Geraldo Si é de Campo Grande, Mato Grosso do Sul, mas já fala com sotaque alemão e, de vez em quando, esquece as palavras em português. Já são mais de trinta anos na Alemanha, cinco deles como solista da companhia da lendária coreógrafa alemã Pina Bausch. Nesta conversa, ele nos conta um pouco sobre sua trajetória artística, relata como foi escolhido para integrar a companhia de uma das mais importantes artistas do século 20 e explica um pouco como serão as duas oficinas intensivas que ele ministrará em dezembro na cidade de São Paulo.

Jane Oliveira: Geraldo, como você foi parar na companhia da Pina Bausch?

Geraldo Si: Foi acidente de percurso. Eu queria muito sair do Brasil porque o Brasil tinha acabado de cair na mão de uma pessoa horrível que nem agora. Quando o Collor assumiu, teve aquele desastre enorme, e a gente estava pensando em mudar para Nova Iorque - eu e minha companheira naquela época. Antes disso acontecer, eu fui para alguns workshops do Carlton Dance Festival, no Sesc Pompeia. Todas as pessoas envolvidas no Festival tinham que dar workshops e a Pina foi uma delas. Eu não conhecia o trabalho dela. Ela fez uma audição em vez de um workshop, que durou horas, e depois da audição enorme ela apontou para mim. Eu já estava completamente desconcentrado, não estava mais nem ouvindo o que elas estavam falando. Foram seis horas de audição! Daí rolou essa história do convite de vir para Alemanha que mudou a minha vida inteira.

JO: Como foi essa experiência?

GS: Eu fui convidado para substituir uma pessoa que estava saindo da companhia. Nunca trabalhei tanto na minha vida, tão disciplinado e com horários! Quando jovem, eu trabalhei muito com movimento puro mesmo e coreografia. Gostava de Netherlands Dance Theatre, mas o teatro não tinha me tocado tanto. Mas quando eu machuquei meu joelho e parei

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Jane Oliveira
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um pouco de dançar, comecei a fazer teatro e caí na mão de uma pessoa maravilhosa chamada Antônio Abujamra e descobri essa outra história. Não era só “dancinha” como o Antônio Abujamra falava (risos). E daí apareceu o maior presente que era ela: a rainha da mistura me convidou para trabalhar com ela e quando saquei isso eu pirei. Então a experiência com a Pina veio me colocar dentro de todas essas coisas que eu estava experimentando separadamente. De repente, eu descobri uma língua que incluía cinema, música, teatro, dança, improvisação... tudo junto, um monte de experiências.

JO: Quanto tempo você ficou na companhia?

GS: Eu decidi sair da companhia já no segundo ano porque eu achava que aquilo tudo era muito, e mesmo por uma coisa meio “Geraldo” mesmo de não gostar de ficar muito tempo debaixo da mesma árvore. Eu queria sair, mas ela me convenceu, com aqueles seus olhos azuis, a ficar mais dois anos e eu acabei ficando cinco anos, o último como convidado. E nesses últimos anos veio uma coisa que me enriqueceu muito como pessoa do palco, que foi a experiência de ter um repertório muito diverso, porque ela estava fazendo tantas coisas novas, que não tinham nada a ver com as peças dela de 1970 ou 1980. Então eu tive essa possibilidade de trabalhar com a Pina que fazia muita dança, com a Pina que fazia muito teatro e com a Pina que estava experimentando as duas coisas juntas. Eu tive também o prazer de ver a última peça que ela fez antes de morrer, e para mim ela tinha encontrado uma solução. Essa última peça, para mim, voltou a ter aquele cerne psicológico. Então foi muito interessante ter todo esse processo de trabalhar com ela, ter todo esse repertório e depois ainda acompanhar o trabalho dela por vinte anos.

JO: E daí você saiu da companhia da Pina…

GS: Eu montei uma companhia de teatro amador e continuei morando na cidade [Wuppertal] por mais vinte anos, e muito saindo dessa coisa da coreografia e indo para a experiência da improvisação. Mas foi muito interessante: quando saí da companhia encontrei pessoas que tinham trabalhado com ela originalmente e comecei a descobrir o processo de trabalho dela do começo. E daí um garoto que estava fazendo um mestrado na Universidade de Giessen me convidou para fazer um trabalho com ele. Quando eu encontrei esse garoto, descobri que as coisas não vêm todas de uma inspiração espiritual de alguém. Ela teve muita influência de um senhor que se chama Sanasardo [Paul Sanasardo, bailarino e coreógrafo estadunidense].

Ele jogava muito objeto no palco, não deixava as pessoas dançarem com palco aberto, colocava interferências na dança, e isso a gente percebe muito nos trabalhos da Pina. Isso para mim meio que fechou o círculo com essa Lecture-Perfomance que eu fiz com ele.

JO: E hoje? Qual a sua dança? Seu foco de trabalho?

GS: Eu parei de dançar muitas vezes na minha vida, e quando saí da companhia eu achei também que eu ia parar com essa história. Continuar em teatro com certeza, mas dança... tinha aquilo que a Pina fazia que eu achava super interessante, mas que eu não queria mais fazer, mas não tinha nada mais fora daquilo que eu curtia. Eu lembrava do Abujamra e falava “mas isso é dancinha”! Eu encontrei muito dessa dança no caminho e também aquela dança que era mais conceitual, que não ligava para dança física, para a fisicalidade. E eu fiquei muito em busca de ver o que acontecia. Daí eu encontrei um cara que me mostrou o caminho dos 208 ossinhos, que é a maneira como ele via o mundo do movimento. Você é um saco que tem 208 ossos e você pode colocar eles como um dominó, cada dia do jeito que você quiser. Essa técnica eu aprendi com esse cara da Indonésia [Suprapto Suryodarmo], que é meio um xamã, mas muito popular aqui na Europa, e com ele eu pirei mais no lance da improvisação mesmo, da liberdade de entrar no espaço e incorporar o espaço e deixar as coisas acontecerem. Esse foi o maior achado para mim, o trabalho que eu desenvolvi até hoje vem disso.

JO: Você está preparando duas oficinas que acontecerão em São Paulo em dezembro próximo. Fale um pouco sobre as propostas que você está trazendo.

GS: Serão duas oficinas. Uma delas é uma retomada do meu processo com a Pina Bausch nos anos 1990, no qual ela trabalhava muito com teatro, com texto e criação de cenas. Para mim vai ser muito interessante: é como pegar um pacote que estava guardado e abrir de novo! Eu estou curioso, mas, claro, não posso me desvincular da experiência de improvisação pura que eu tive. A intenção é trabalhar uma semana e depois fazer uma performance de 40 minutos. Vamos ver como produzir material, embasado muito na improvisação, não só como impulso do trabalho, mas como improvisação cênica mesmo. Para a outra oficina, eu tenho um grupo aqui em Berlim que chama Playground, que é baseado nessa história: você começa com uma estrutura muito forte para fazer com que você perceba o espaço e as outras pessoas e durante o período dessas 3 ou 4 horas você destrói essa estrutura. A intenção é que no final você improvise livre de qualquer estrutura. Eu gosto de fazer isso durante uma semana porque vai ficando mais e mais fácil para você improvisar. Eu estava buscando um nome e eu achei o Ibipío, que representa para mim a liberdade de estar no agora, de não ter antes, não ter depois. Tem uma tribo que vive na Amazônia que não define nem ontem, nem amanhã, porque eles acreditam que não tem ontem nem amanhã. É tudo no Ibipío, que é o suprassumo do zen. Você está no Ibipío quando você está no agora.

NOTAS DE DANÇA N.1

OFICINAS COM GERALDO SI

TANZTHEATER

De 05 a 08 de dezembro (segunda a quinta), das 9h às 13hs, no espaço A Zona Franca, que fica na Rua Almirante Marques Leão, 378, na Bela Vista. A performance final acontecerá no sábado, dia 10 de dezembro, no final da tarde.

Inscrições:

https://www.sympla.com.br/tanztheater-oficina-com-geraldo-siloureiro__1785095

IBIPÍO

De 12 a 16 de dezembro (segunda à sexta), das 9h às 13hs, no espaço MovA.C, que fica na rua Valério de Carvalho, 63, em Pinheiros.

Inscrições:

https://www.sympla.com.br/ibipio-oficina-para-percepcao-do-momento-eativacao-da-presenca-cenica__1785014

Ambas as oficinas serão abertas a músicos, atores, artistas plásticos e pessoas interessadas na arte da performance (acima de 16 anos).

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A DANÇA LEVA CONSIGO INOVAÇÃO E INFORMAÇÃO

Hoje não poderia ser diferente: entre multimídia e inovações tecnológicas, a dança se incorpora ao audiovisual e ao site specific para compor a criação, apresentando no conteúdo da cena novos ângulos para olhares e conceitos cenográficos.

NOTAS DE DANÇA N.1
Simone Maggio
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Fotos: Simone Maggio

1 2: "Galas Solidárias”, com Marianela Nuñes. Club Aleman San Martin, Buenos Aires, Argentina (2019).

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4 5: "Take 3", Jorge Garcia. Galeria Olido, Sao Paulo (2022).
PROJE|TO GRÁFICO Tono Guimarães »

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