24/08/2016 16h44 - Atualizado em 24/08/2016 20h00

Delator volta a acusar maestro de desvios de verba do Theatro Municipal

Ex-diretor diz que John Neschling sabia de notas frias e era beneficiado.
Neschling negou crimes e não compareceu à acareação na Câmara.

Tahiane StocheroDo G1 São Paulo

Em primeiro depoimento público, o ex-diretor da Fundação Theatro Municipal José Luiz Herência, delator do esquema de desvio de recursos públicos, voltou nesta quarta-feira (24) a acusar o maestro John Neschling, diretor cultural do Theatro, de participar das fraudes. Ele disse que havia um acordo entre ele, o maestro e o diretor do instituto que administrava o Theatro, William Naked, para que as fraudes e os desvios de recursos públicos ocorressem.

"Existia um acordo tácito onde o maestro obtia suas vantagens pessoais fora do país e nós obtíamos a nossa aqui no Brasil. E este acordo durou longos três anos, quase quatro", afirmou.

O acordo era que o maestro obtia benefícios no exterior e contratos que promoviam o nome dele, após a indicação de nomes para o Theatro, "e também vantagens financeiras e nós emitíamos as notas frias de obras" de obras e serviços que não eram realizadas.

Segundo Herência, Neschling mentiu à CPI quando disse que não tinha ingerência sobre pagamentos do Theatro. "Ele estabelecia nomes, valores, contratos e forma de pagamento, não tem outro nome para isso se não ingerência", afirmou. O maestro afirmou que apenas indicavas nomes, e que não assinava contratos.

Ainda de acordo com Herência, houve um momento em que a Controladoria do município questionou o contrato da empresa de Neschling com o IBGC (Instituto Brasileiro de Gestão Cultural), que administra o Theatro, e os pagamentos mensais de R$ 150 mil ao maestro, e que em uma reunião no gabinete do secretário de comunicação, Nunzio Briguglio, houve um pedido para que isso fosse retirado do relatório porque poderia complicar para Neschling, disse Herência.

Neschling nega
O maestro John Neschling prestou depoimento na última semana e negou envolvimento no esquema criado por Herência usando desvio de recursos com base em notas frias. Na ocasião, Neschling disse que não iria comparecer à acareação marcada entre ele, Herência e William Naked, diretor do IBGC acusado também por Herência de participação no esquema. Neschling disse na ocasião que a acareação se tornaria uma "briga de rua".

Em nota, o advogado do maestro diz: "O maestro reitera não ter mais o que esclarecer, considerando os fatos exaustivamente expostos nas 5 horas e meia de seu depoimento à CPI. E que é ilusão imaginar que Herencia e Nacked irão mudar suas fantasiosas versões sobre contratos e convênios celebrados pela Fundação Theatro Municipal de São Paulo - ponto sobre o qual os vereadores afirmam permanecer divergências".

Nesta quarta-feira estava marcada uma acareação na CPI de Herência com o maestro e William Naked, ex-diretor do IBGC. O maestro não compareceu, alegando que haveria uma "briga de rua" e que não era obrigado a fazer prova contra si mesmo. Os vereadores aprovaram então a condução coercitiva do maestro. Naked apresentou um habeas corpus e prestou depoimento pela manhã no Ministério Público.

Herência fez acordo de delação premiada com o Ministério Público, no qual acusou Neschling de participar de um esquema para superfaturar contratos com notas frias que causado um prejuízo de pelo menos R$ 18 milhões aos cofres públicos. Neschling nega os crimes.

"Não vim aqui me fazer de herói. Roubei. Dos adjetivos que o Neschling me chamou, bandido até cabe. Mas não sou meliante, não fiquei dois meses me escondendo na Suíça e nem me recusei a vir aqui prestar depoimento e me fazer de vítima", afirmou Herência.

O ex-diretor do Theatro Municipal negou que tivesse condições de saber quanto foi roubado realmente e teve uma discussão com o vereador Alfredinho (PT). "A promotoria falou que foram R$ 11 milhões (desviados do Theatro), o senhor falou que roubou R$ 6 milhões, cadê o resto?", perguntou o vereador Alfredinho (PT). "Eu nunca disse este valor, eu já informei ao MP", rebateu Herência. "Eu não sei (direito o valor), tem imposto. Mesmo quem é corrupto paga imposto", disse Herência.

Ele afirmou  ainda que o salário de R$ 150 mil mensais de Neschling não é condizente com o mercado, como afirmou o maestro, e que ele mentiu sobre apresentações feitas no exterior e que disse que nunca havia recebido denúncias sobre notas frias.

O ex-diretor do Theatro também citou três agenciadores que trabalham para Neschling - dois deles residentes em Milão, na Itália -e que trouxeram, durante a atuação do maestro à frente do Theatro desde 2013, músicos, segundo ele, de baixa qualidade de vários países e que receberam muito bem por isso.

Um deles é Valentin Prochinski, agenciador de Neschling e que recebeu quase R$ 1 milhão para um projeto idealizado por Neschling e que não foi realizado, o "Alma Brasileira". Herência diz que desconfiou do caso do repasse e que "nada justificava" o pagamento sem contrato. Ele disse que após o cancelamento do projeto, desconhece algum pedido de ressarcimento.

Também foram pagos R$ 500 mil por vídeos institucionais do Theatro, que nunca foram divulgados. Herência disse que Neschling sempre recebeu por regências, ao contrário do que o maestro afirmou na CPI de que se contrato incluía as regências. Isso porque a CPI encontrou além dos valores do salários, notas fiscais a favor do maestro por regências. Herência soube explicar as notas.

A defesa de Neschling divulgou nova nota para rebater as declarações de Herência: "As cenas de hoje na CPI comprovam o que se afirmou na petição endereçada para justificar a ausência de John Neschling à acareação: além da inocuidade, sua presença serviria apenas para a submissão aos ataques vis proferidos por Herencia e alguns vereadores, que se mostraram suscetíveis ao simples exercício de direito. Apesar da sólida fundamentação da petição, consideraram não ter sido ela “séria”, e como punição por ele ter ousado exercer seus direitos, decidiram, contra a lei e em ato de abuso de autoridade, conduzi-lo coercitivamente, além de confiscar seu passaporte e determinar a suspensão de seus pagamentos".

"É lamentável assistir a tamanho abuso, como se a CPI pudesse cassar o direito que o maestro tem de proteger sua imagem, sua dignidade e sua honra, e como se pudesse puni-lo por isso, fazendo-o objeto da vontade dos investigadores, a serviço de finalidades políticas. O absurdo foi tão evidente, que Herencia foi tratado como herói, e suas mentiras tomadas como verdades. As acusações nem mesmo fazem sentido, e Neschling usará os instrumentos jurídicos disponíveis para arrostar o arbítrio que se pretende consumar contra ele."

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